"Vai haver momentos em que meus crimes
Vampiro
não é o meu jogo preferido da linha Storyteller. Nem de longe. O motivo é
simples: têm jogos que funcionam muito melhor na teoria do que na prática. Um
conto, um filme, um romance são gêneros diferentes da narrativa compartilhada
que é o RPG. Sabe por quê? O enredo principal é alterado pelos jogadores, além disso Vampiro exige muito do narrador e é repleto de
peculiaridades que se não forem inseridas na crônica de maneira acertada, transformam qualquer Drácula de Bram Stocker em um Fim de tarde sem sal.
Mas
por que isso acontece e quais peculiaridades são essas? Primeiro, tanto o livro
básico de vampiro como todos da linha Storyteller são completíssimos e ricos em
dicas de construção de personagens e narrativas. Entretanto, ao invés de
saborear o livro lentamente como um bom vinho, alguns insistem em absorver tudo
em uma única dose. Personagens, regras, qualidades e defeitos estão longe de
superar o básico: natureza, comportamento (afinal, vampiro é um jogo de horror
pessoal) e o mais importante de todos, o tom. Essa é a peculiaridade mais
importante para quem deseja viver aventuras no mundo de Vampiro a Máscara.
Não
pense no jogo como um Death Metal rasgado. Seja mais subliminar. Os Vampiros de Storyteller até podem ser diretos e mortais, mas nunca
devem ser banais. Mesmo um cainita de geração baixa já viveu muito tempo e já
passou por muitas experiências que o fizeram amadurecer, mudar, construir uma
personalidade definida (ou não!). Vampiros não são criaturas simplórias e
sempre querem mais que os humanos normais. Construa NPCs pensando nisso e os
seus jogadores poderão seguir o seu
exemplo.
Pois
é. Imagine só começar uma crônica de Vampiro abruptamente, sem preliminares,
sem sentir o clima do jogo. Essa regra serve para qualquer RPG: antes de
começar ambientes os jogadores no cenário. Faça-os imaginar. Refletir. Sair do
mundo real e viajar na sua narrativa.
“Blz,
então vocês estão na cidade e o príncipe vem falar com vocês” ¬¬ Você está
fazendo isso certo?
Não
custa nada tentar criar uma atmosfera envolvente. Está sem tempo? Sem
imaginação? Procure nos livros de terror e suspense. Veja como é uma narrativa
sobre a noite e tente copiar, adaptar a realidade da sua crônica.
Veja
esse texto em primeira pessoa, que pode ser usado como um pensamento de um dos
personagens para abrir a crônica:
“A noite escura me assombra a mente
A lua e as estrelas escondem-se de mim por entre as nuvens escuras
Somente as corujas não me abandonam
Seguem comigo, me anunciando pelas ruas desertas.
O frio intenso congela a alma que ainda habita esse corpo
Arrepiado pelo sereno impiedoso da madrugada
Madrugada esta que me digere como um alimento
Que é ruminado pelas ilusões e agruras da vida...”
A lua e as estrelas escondem-se de mim por entre as nuvens escuras
Somente as corujas não me abandonam
Seguem comigo, me anunciando pelas ruas desertas.
O frio intenso congela a alma que ainda habita esse corpo
Arrepiado pelo sereno impiedoso da madrugada
Madrugada esta que me digere como um alimento
Que é ruminado pelas ilusões e agruras da vida...”
Jussara Alves
Filmes começam do nada? Os que começam pelo menos
tem uma boa explicação para isso. Lembra do início do primeiro Anjos da Noite?
O que seria do filme sem aquela narrativa da vampira Selene no topo do Arranha
Céu? É o mesmo na sua crônica. Sem uma boa narrativa, uma história sobre
vampiros não é uma história sobre vampiros.
A cidade!
Pra
mim todo RPG deve ter uma dose de fantasia. Vai narrar na sua cidade? Ótimo. Pelo
menos tente enxergá-la sob a ótica do Mundo das Trevas, transforme-a em um
lugar interessante e sombrio. Por que motivo vampiros estariam na cidade? Como
eles chegaram lá? Com que propósito?
Onde eles moram? O que fazem? Qual a mentalidade da população? Quais clãs
existem?
Por
favor, se não usar um By Night pronto, siga essas recomendações e não banalize
os Vampiros. As regras oficiais dizem que existe um Cainita para cada 100.000
habitantes. Isso quer dizer que Recife, com seus pouco mais que 1.500.000
habitantes teria uma população de 15 Vampiros apenas.
Cidades
desconhecidas tendem a impor mais respeito aos jogadores. Em uma cidade
familiar eles se sentem em casa. Já em um local desconhecido, será descoberto
aos poucos e deglutido com parcimônia. Por isso nunca curti a ideia de rolar
uma aventura na minha própria cidade. Vampiros pegando o mesmo ônibus que eu?
Indo no hospital que eu vou? Não sem uma boa adaptação!
Horror pessoal
Mesmo
os jogos focados na ação devem levar em consideração a vida (ou a falta dela)
dos personagens. Como ele se sente em relação a sua nova condução? O que ele
acha do seu clã? Qual a relação com o seu senhor? Ele não estaria cansado de
viver? Quais os seus desejos? Que relação ele mantêm com os seus companheiros
do passado? Imagine ver a sua mulher casada com outro homem depois da sua
morte. Talvez o personagem a tenha observado sem se revelar durante todo esse
tempo e agora ele a vê tocando a vida para frente. Qual a posição dele em
relação a isso?
Explore
a personalidade dos personagens. Crie cenas especialmente para isso. Cobre um
background. Personagens de Vampiro: a máscara devem ser bem elaborados e o
narrador deve ajudar a desenvolvê-los. A história deve ter eles como foco e não
ter um enredo linear.
Espero
que isso ajude...
Muito boa a matéria, concordo com os pontos apresentados. Vampiro é um jogo excelente, mas infelizmente poucos são capazes de conseguir extrair ao máximo (ou pelo menos metade, ou um terço) de seu potencial.
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